Palácio Nacional de Queluz
ARTE CULTURA E SONHO
Ao vermos esta séria de fotos sobre o Palácio de Queluz de Armando Isaac, a primeira impressão que nos dá é a de um raro documento icónico desta estrutura patrimonial que foi Palácio Real: representativo do fim do ciclo do ouro do Brasil. E digo raro por ter sabido juntar o sentido documental da foto, com o sentido estético, tornando o conjunto muito apelativo ao olhar, à reflexão histórica e artística, mas também ao sonho!
Se entendermos a História da Fotografia como uma sequência da História da Pintura facilmente percebemos que um "instantâneo fotográfico" em termos conceptuais, se assemelha muito ao desenho e ao esquiço, mas igualmente à gravura. Por isso é com propriedade que vemos nas teorias de Arte mais comuns, a fotografia ser devedora do Pictórico, mas que devido ao instante, modernamente o substituiu. Pela mesma razão, já não vemos o facto de Nadar voar em Balão, sobre a cidade de Paris para fotografa-la (sec. XIX) uma excentricidade de rico, como o designaram na época. A sua " excentricidade" patenteou a fotografia aérea e de então para cá o mundo nunca mais foi o mesmo e o simples "estou a ouvir" transformou-se em, " estou a ver" e nele estamos.
O pioneirismo de Nadar contribui para que nenhuma artista dispense a fotografia como ferramenta do seu trabalho Artístico. O seu uso possibilitou entender o mundo de forma quase ilimitada sobretudo quando combina aspetos antropológicos e paisagísticos. Tornando a fotografia no melhor meio para a difusão do conhecimento sobre a sociedade humana, o meio e o ambiente, mas também para recordar todo o tipo de ações e tradições onde a História de Arte se inclui.
Pela fotografia o nosso olhar passou a estar em todo o lado, por esta ligar o observador, à realidade por falarem diretamente ao espectador, que lhes conta situações e atitudes. Mas de forma invisível, também o liga ao sonho e à viagem como experiências vitais de vida. Esta união transformou-se num meio de fuga frente aos fenómenos cada vez mais massificados da cultura.
É pois, neste âmbito que este trabalho de Armando Isaac ao Palácio de Queluz e seus jardins se inserem. As suas fotos ultrapassam o mero valor documental desta obra que muitos consideram a última do Barroco na Europa.
Desvelando-nos um olhar de fino quilate que é simultaneamente plástico e estético, pedagógico e livre. Permitindo-nos organizar o que nos mostra pelo interesse dos temas, que são, diversificada pela História ( politica e mítica) ou pela Arte (Pintura, Design, Tapeçarias, Mobiliário, Azulejaria, Jardins, Escultura…) tudo desfila diante do nosso olhar na sua beleza natural.
A minha formação e atividade escultórica impele-me salientar o Jardim, por este corresponder, desde os primórdios da humanidade, a ideia de Utopia realçada em vários mitos sobre o ideal de natureza expressos no " Jardim do Éden/Paraíso" e o "Eliseu" grego.
O jardim deste palácio enfatiza o sentido teatral, recorrendo ao cenográfico e faustosos para dar a um efeito de infinito: arquitetura e paisagem, tende a misturar-se com a escultura, quando não são os edifícios e anexos do palácio tratados como se fossem uma enorme escultura.
Em termos simbólico, o jardim corresponde à ideia da recreação de um mundo idílico, no desejo do homem habitar um mundo melhor. Uma utopia alcançável, como sinónimo de lugar de tranquilidade e felicidade. Espaço de felicidade, belo, agradável, útil e saudável. Um emblema que se forjou com as imagens do Éden e do Eliseu. O jardim, pretende representar um âmbito natural criado à pequena escala de um microcosmos natural para uso e desfrute humano. É a natureza transformada em sentimento.
Esta mesma conceção do jardim nunca variou com o nosso domínio do espaço ou o mundo fazia mudar a forma na qual o homem se relacionava com ele. Desde os jardins egípcios com as suas piscinas ou os jardins suspensos da babilónia, ate aos vasos de flores nas varandas das nossas cidades continuamos a ver o jardim como resposta diferenciada das nossas conceções sobre essa ideia de Utopia que expressa a relação temos com a Natureza. No presente revestiu aa designação de "Defesa do meios ambiente" e a "Ecologia".
Do mesmo modo se pode dizer que, o jardim se apresenta como uma recreação da Geografia e a História Mítica da humanidade, é o lugar dos Deuses, o lugar no qual se recriam mitos e um Altar onde se venera a natureza. E não são poucos os deuses que vemos representados pelos recantos e fontes deste belo Jardim. Com eles a nossa fantasia recria-se em histórias petrificadas, no encontro de ninfas ou de deusas Hespérides. Também vários deuses em bronze surgem nas águas e fontes como Posídon, armado com o seu famoso tridente e vários golfinhos a acompanha-lo na sua viagem imperial. Outros entre a vegetação e sentados espreitam como que a recordar este hino à natureza.
Por todo o jardim, paredes e anexos do palácio, surgem figuras fantásticas para reforçar esse sentido mágico de espaço de infinito e evocar a vida como uma permanente viagem pela fantasia. Mostrando-nos ainda animais fantásticos e alados que a cada momento, se cruzam connosco nesta viagem profunda à Cultura, Arte e a Fantasia, através de fotos.
Por isso este magnifico conjunto de fotos recordam-me um dos doze trabalhos de Hércules aquele em que vai ao jardim das Hespérides obter as celebres maçãs de ouro da imortalidade. Foi isso que fez, Armando Isaac, com as suas fotos, como elas podemos celebrar momentos de deleite estético e desejada perenidade: Bem-haja!
António Delgado
Professor Doutor de Belas Artes
PALÁCIO NACIONAL DE QUELUZ
JARDIM, LAGOS E FONTES
Fotos: © 2022 Armando Isaac